A Urgência da Adoção do Fluxo Concentrado no Processo Previdenciário: Uma Análise Necessária
A Urgência da Adoção do Fluxo Concentrado no Processo Previdenciário: Uma Análise Necessária
INTRODUÇÃO
De acordo com o artigo 6º da Constituição Federal de 1988, são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o emprego, a habitação, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, além da assistência aos necessitados, conforme estabelecido pela Constituição.
A previdência social é um sistema público que busca garantir proteção financeira aos trabalhadores e seus dependentes em situações como aposentadoria, invalidez, morte e maternidade, entre outras necessidades. No Brasil, esse sistema é administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que faz parte da seguridade social juntamente com a saúde e a assistência social.
Dentre os benefícios que o INSS oferece ao cidadão, está a aposentadoria por idade rural, concedida a trabalhadores rurais que atingem a idade mínima exigida e comprovam o exercício da atividade rural. Contudo, observa-se que existem muitos desafios para comprovar esse tempo de atividade, o que dificulta o acesso a esse direito e causa morosidade nos processos.
Para evitar essa morosidade e garantir que o trabalhador tenha acesso ao seu direito de forma mais célere, foi desenvolvido o chamado fluxo concentrado. O fluxo concentrado é uma estratégia de gestão, com natureza de negócio jurídico, que foi implementada em todo o INSS, com o objetivo de melhorar a eficiência e a qualidade do atendimento aos segurados. A coordenação e o planejamento foram realizados em nível nacional, mas a execução ocorre em diversas unidades de análise espalhadas pelo país, onde cada Tribunal Regional Federal expede Portaria específica para implementar a metodologia em sua jurisdição.
Dentre os Atos Normativos publicados, a Portaria DISUB-MCL nº 26/2023 (SEI 0524416), assinada pelos Juízes da Subseção Judiciária de Montes Claros, pelo INSS (através da Procuradoria Federal-Regional) e pela Ordem dos Advogados do Brasil – 11ª Subseção da OAB-MG, tem o propósito de dar celeridade aos processos do Juizado Especial Federal, sendo exclusivo para demandas previdenciárias rurais, como benefícios por incapacidade (auxíliodoença e aposentadoria), salário-maternidade, aposentadoria por idade rural, aposentadoria híbrida e pensão por morte.
A adoção desse novo fluxo processual garante vantagens para o trabalhador, o Poder Judiciário, o INSS e os advogados, promovendo uma grande evolução na efetivação dos direitos sociais, principalmente na concessão da aposentadoria por idade rural.
O FLUXO CONCENTRADO COMO SOLUÇÃO: O CONTEXTO BRASILEIRO E OS DESAFIOS NA COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL.
No contexto brasileiro, a comprovação da atividade rural apresenta muitos desafios para a maioria dos segurados, devido à informalidade do trabalho no campo e às dificuldades em obter documentação adequada, muitas vezes antiga, que pode se perder com o tempo ou se tornar inacessível. Em muitos casos, trabalhadores enfrentam dificuldades para obter segundas vias ou comprovantes de registros feitos por seus familiares. A evolução da legislação previdenciária e a interpretação das normas pelo INSS também criam desafios. A exigência de mais provas e o rigor na análise dos documentos têm dificultado a concessão do benefício, levando muitos trabalhadores a recorrerem à via judicial para obter o reconhecimento do direito.
Quando os documentos não são suficientes para a produção de provas, é comum que seja exigido que o segurado busque a comprovação da atividade rural por meio de testemunhas. No entanto, os juízes avaliam as provas testemunhais com critérios rigorosos, exigindo coerência entre os depoimentos e as provas documentais existentes. O benefício previdenciário por idade de atividade agrária possui como requisitos: idade mínima de 55 anos para mulheres e 60 anos para homens; tempo mínimo de atividade rural de 15 anos antes do requerimento do benefício; e apresentação de documentos que comprovem o exercício da atividade rural (mesmo que não tenha havido contribuição para o INSS, no caso de segurado especial).
Para a comprovação do tempo de atividade rural, em regra, é necessário apresentar documentos como a Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (DAP), o Cadastro de Imóveis Rurais (CAFIR), o Registro Geral da Pesca (RGP), o Seguro-Desemprego do Pescador Artesanal (SDPA), documentos da Divisão de Negócios de Controle Financeiro (DICFN), do Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), do Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (SIPRA) e o registro como Microempreendedor Individual (MEI), entre outros documentos que possibilitem a comprovação. Os processos para concessão de aposentadoria por idade rural, principalmente os judiciais, tendem a ser demorados devido a essas dificuldades. É nesse contexto que surgiu o fluxo concentrado, com o propósito de tornar os processos mais céleres. Ele possui caráter facultativo e preferencial, exclusivo para demandas previdenciárias rurais em que haja controvérsia sobre a qualidade de segurado especial.
A presença de um advogado não é obrigatória, mas, devido à complexidade dos casos e ao número de regras específicas, é sempre recomendável buscar assessoria jurídica especializada para ser orientado sobre quais provas apresentar, como fundamentar a ação e quais estratégias utilizar para defender o direito do segurado, aumentando as chances de concessão do benefício. O fluxo concentrado é uma etapa de produção antecipada de prova, sem a necessidade de audiência de instrução, que ocorre entre a propositura da ação e a citação do INSS. Assim, nos processos que buscam a implementação de benefícios rurais, como no caso da aposentadoria rural, a parte interessada pode aderir ao fluxo concentrado mesmo depois da perícia médica, desde que antes da citação do INSS. Havendo interesse no fluxo concentrado, a parte autora, representada ou não por advogado, pode aderir ao fluxo até que haja a citação do INSS, devendo, para tanto, preencher o formulário anexo à Portaria, correspondente ao benefício previdenciário requerido, e apresentá-lo diretamente no sistema judiciário pertinente (E-Proc ou PJE).
AS VANTAGENS DA ADOÇÃO DO FLUXO CONCENTRADO
A adoção desse negócio jurídico processual possui muitas vantagens em relação ao modelo de tramitação tradicional:
– Aumento do número de acordos: Com a produção antecipada de prova oral e documental, o percentual de propostas de acordo do INSS aumenta significativamente, pois eventuais dúvidas são supridas pelos vídeos apresentados junto à inicial.
– Maior celeridade processual: Com a adoção do fluxo, em caso de contestação, após a réplica, o processo é concluso para a sentença em um prazo menor do que no trâmite comum, pois não é realizada audiência de instrução e julgamento.
– Diminuição de despesas processuais: Com a produção de prova oral e documental na inicial, a parte e suas testemunhas não têm despesas para ir até o fórum para a realização da audiência de instrução e julgamento, além de um menor tempo de espera para a concessão do direito, fazendo com que o segurado receba seu benefício de forma mais rápida, garantindo a efetivação desse direito social.
CONCLUSÃO
A adoção do fluxo concentrado no processo judicial para a concessão de benefícios e aposentadorias rurais representa um grande avanço para garantir maior eficiência e celeridade na análise dos processos.
O alto volume de demandas previdenciárias na Justiça, aliado à morosidade na tramitação dos processos, tem prejudicado milhares de trabalhadores rurais que dependem desse benefício para sua subsistência. Nesse contexto, a implementação do novo modelo de tramitação no Judiciário surge como uma solução para reduzir a demora na concessão dos benefícios e assegurar que a justiça seja acessível e efetiva para aqueles que mais necessitam.
Ao longo do texto, foram apresentados argumentos que demonstram como a centralização da análise dos processos pode uniformizar decisões, reduzir divergências interpretativas entre magistrados e varas e minimizar o número de recursos desnecessários, tornando o trâmite judicial mais eficiente. Ainda que existam desafios sobre possíveis dificuldades na implementação desse modelo, como a necessidade de reestruturação do Poder Judiciário e o treinamento de servidores, é inegável que a padronização dos critérios decisórios traria mais segurança jurídica e evitaria decisões subjetivas e muitas vezes conflitantes, que hoje geram insegurança jurídica tanto para os segurados quanto para o próprio sistema previdenciário.
A judicialização não deve ser tratada apenas como um problema estatístico do Judiciário, mas sim como uma questão social urgente. Muitos segurados rurais, já em idade avançada e em situação de vulnerabilidade social e econômica, enfrentam muitos anos de espera para obter uma decisão favorável, passando por grandes dificuldades financeiras e até mesmo falecendo antes da concessão do benefício. O atraso no julgamento dessas ações representa não apenas um entrave burocrático, mas uma violação ao direito fundamental a uma vida digna na velhice.
Portanto, a implementação do fluxo concentrado no Judiciário não é apenas uma alternativa viável, mas uma necessidade para garantir maior efetividade na prestação jurisdicional e efetivação dos direitos sociais. A criação de núcleos especializados e o uso de ferramentas tecnológicas para agilizar a análise de provas são medidas que podem transformar a forma como a Justiça lida com essas demandas.
Diante disso, é fundamental que magistrados, tribunais e demais operadores do Direito se mobilizem para viabilizar essa mudança, assegurando que os trabalhadores rurais não sejam penalizados pela morosidade do sistema e possam ter acesso à sua aposentadoria de forma célere e justa.
BRASIL. LEI 8.213 de 24/07/1991 – Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em 18 fev 2025.
Setor Previdenciário – Amaral & Castro Advocacia
Escrito por: Emanuel Nobre, Bianca Vieira e Natália Pessoa.