O cancelamento de voos é um problema frequente e impactante para os passageiros. Este artigo aborda as principais causas, os direitos garantidos pela legislação brasileira e jurisprudência recente sobre o tema, destacando a responsabilidade das companhias aéreas.

O DIREITO DO PASSAGEIRO AÉREO NOS CASOS DE CANCELAMENTO DE VOO

O cancelamento de um voo pode resultar em enorme transtorno para o

passageiro que planejou a sua viagem com antecedência e que pretende chegar ao seu

destino na data e horário previamente acordado.

Centenas de passageiros são submetidos ao cancelamento de suas viagens

todos os dias, sem que haja qualquer explicação plausível ou aviso prévio. Salienta-se

que o cancelamento de um voo, seja por problemas técnicos, mau tempo ou qualquer

outro imprevisto, não exclui a responsabilidade do fornecedor, tendo em vista que

quaisquer destas hipóteses decorrem do risco da atividade empresarial.

Neste artigo, veremos as principais causas de cancelamento de voo, o que

diz a lei sobre o assunto, os direitos do passageiro aéreo, além de recentes julgados

acerca do tema.

1. Hipóteses de cancelamento de voo pela companhia aérea

O cancelamento de um voo pode acontecer por vários motivos. Entender

essas razões é importante para lidar melhor com a situação. A seguir, conheça as

principais causas que podem levar ao cancelamento de um voo:

● Mau tempo

O motivo mais frequente é o mau tempo. Condições meteorológicas

adversas, como tempestades, nevascas ou furacões, podem tornar inseguro a decolagem

ou o pouso, levando as companhias aéreas a cancelarem ou redirecionarem os voos para

garantir a segurança de todos a bordo.

● Manutenção na aeronave

A prioridade máxima de qualquer companhia aérea é a segurança dos

passageiros. Por isso, a manutenção programada das aeronaves é uma prática comum e

essencial. No entanto, imprevistos podem acontecer durante as inspeções, obrigando o

cancelamento do voo para assegurar que a aeronave esteja em perfeitas condições de operação. Essas manutenções não planejadas também são bastante comuns e

representam uma das principais razões para atrasos ou cancelamentos.

● Overbooking

O overbooking acontece quando a companhia aérea vende mais passagens

do que o número de assentos disponíveis, uma estratégia usada para compensar

passageiros que não aparecem (no-show). Nesse caso, a empresa busca voluntários para

ceder seus lugares e, se necessário, oferece compensações ou alternativas, como

reembolso ou remarcação em outro voo. Apesar de ser uma prática comum para

aumentar lucros, o overbooking pode resultar na negativa de embarque para alguns

passageiros, especialmente quando não há voluntários.

● Problemas operacionais

Falhas técnicas na aeronave, troca de aviões, atrasos na saída da tripulação

anterior ou dificuldades na infraestrutura do aeroporto são exemplos de problemas

operacionais que podem causar o cancelamento do voo. Esses fatores, muitas vezes

imprevisíveis, são gerenciados com protocolos rigorosos para garantir a segurança de

todos.

● Greves e manifestações

Greves de controladores de voo, pilotos, tripulantes ou funcionários do

aeroporto podem paralisar as operações, levando ao cancelamento de voos.

Manifestações que bloqueiam acessos ao aeroporto também podem afetar os voos,

causando atrasos ou cancelamentos. As companhias aéreas seguem regras específicas,

políticas internas e procedimentos de contingência para minimizar esses impactos,

sempre buscando oferecer alternativas e assistência aos passageiros sempre que

possível.

2. O Que Diz a Lei Sobre o Cancelamento de Passagem Aérea Pela Empresa?

A situação em que um passageiro chega ao aeroporto, pronto para sua viagem, e é

surpreendido com o cancelamento do voo pela companhia aérea é, sem dúvida,

frustrante. No entanto, é crucial que o consumidor esteja ciente de que a legislação brasileira o ampara em tais circunstâncias, garantindo uma série de direitos. Tanto o

Código de Defesa do Consumidor (CDC) (Lei nº 8.078/90) quanto as regulamentações

específicas da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), notadamente a Resolução nº

400/2016, estabelecem as obrigações das empresas aéreas em casos de cancelamento de

voo.

2.1 Informação ao Passageiro

O artigo 6º, inciso III, do CDC (Lei nº 8.078/90) preconiza o direito básico do

consumidor à informação clara e adequada acerca dos produtos e serviços, incluindo

suas características, qualidade, quantidade, preço e os riscos inerentes. Em caso de

cancelamento de voo, a companhia aérea possui a obrigação de informar o passageiro

de maneira imediata e detalhada sobre os motivos do cancelamento, as alternativas

disponíveis e seus direitos.

A Resolução nº 400 da ANAC, em seu artigo 27, detalha essa obrigação, exigindo que a

transportadora mantenha o passageiro informado a cada 30 minutos sobre a previsão de

partida de voo atrasado e informe imediatamente em caso de cancelamento, interrupção

do serviço ou preterição de embarque.

2.2 Direitos Consequentes ao Cancelamento

O cancelamento de voo por parte da empresa aérea assegura ao passageiro diversos

direitos, conforme previsto na Resolução nº 400 da ANAC:

● Reembolso Integral:

O passageiro tem o direito de receber a restituição integral

do valor pago pela passagem, incluindo a tarifa de embarque (Artigo 30, inciso

I, da Resolução nº 400/2016 da ANAC). O reembolso deve ser processado em

até 7 dias a contar da solicitação do passageiro (Artigo 29 da Resolução nº

400/2016 da ANAC), observando a forma de pagamento utilizada na compra.

● Reacomodação:

O passageiro pode optar por ser realocado em outro voo da

mesma companhia aérea para o mesmo destino, na primeira oportunidade

(Artigo 28, inciso I, da Resolução nº 400/2016 da ANAC).

● Endosso:

O passageiro pode solicitar o endosso do bilhete para outra companhia

aérea, sem custo adicional, caso haja disponibilidade (Artigo 28, inciso II, da

Resolução nº 400/2016 da ANAC).

● Execução do Serviço por Outra Modalidade de Transporte:

A companhia

aérea pode oferecer ao passageiro a conclusão da viagem por outro meio de

transporte, como ônibus ou van (Artigo 28, inciso III, da Resolução nº 400/2016

da ANAC).

2.3 Assistência Material

Ademais, dependendo do tempo de espera no aeroporto em decorrência do

cancelamento, a companhia aérea deve prestar assistência material gratuita ao

passageiro, conforme o artigo 27 da Resolução nº 400/2016 da ANAC:

● A partir de 1 hora: Facilidades de comunicação (internet, telefone, etc.).

● A partir de 2 horas: Alimentação (voucher, refeição, lanche, etc.).

● A partir de 4 horas: Hospedagem (em caso de pernoite) e transporte de ida e

volta para o local de acomodação, se o passageiro não residir na localidade do

aeroporto.

2.4 Responsabilidade Civil e Danos

O cancelamento de voo, especialmente quando ocorre de forma inesperada e sem

justificativa plausível, pode acarretar danos materiais e morais ao passageiro. O artigo

14 do CDC estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pelos

danos causados aos consumidores por falhas na prestação dos serviços.

Dessa forma, além dos direitos à informação, reembolso, reacomodação e assistência

material, o passageiro prejudicado pode buscar indenização por eventuais prejuízos

sofridos, tais como perda de compromissos, despesas extras com transporte e

hospedagem não planejadas, e sofrimento psicológico decorrente da situação. A

comprovação do dano e da relação de causa e efeito entre o cancelamento e o prejuízo é

fundamental para a obtenção da indenização.

3. O que fazer se o meu voo for cancelado?

Em situações de cancelamento de voo, o passageiro deve entrar em contato

diretamente com a companhia aérea responsável, a fim de solicitar a aplicação de uma

das medidas previstas pela legislação brasileira: (i) reacomodação em outro voo

disponível para o mesmo destino; (ii) remarcação da passagem para data futura,

conforme a conveniência do passageiro; ou (iii) reembolso integral do valor pago pela

passagem.

Caso o passageiro necessite aguardar no aeroporto devido ao cancelamento,

a companhia aérea tem o dever de fornecer assistência material, a qual pode incluir itens

como alimentação, hospedagem e transporte, conforme o tempo de espera e a distância

entre o local de origem e o domicílio do passageiro.

Para assegurar o acesso a esses direitos, é essencial que o consumidor

mantenha em sua posse os documentos comprobatórios relacionados ao voo e ao

cancelamento, tais como comprovantes de compra, cartões de embarque, registros de

comunicação com a companhia aérea, bem como recibos e notas fiscais de despesas

extraordinárias decorrentes do ocorrido.

A preservação dessas evidências é indispensável para eventual formalização

de reclamações junto aos órgãos competentes ou para a adoção de medidas judiciais

cabíveis.

4. Jurisprudência sobre casos de cancelamento de voo

Há diversos julgados favoráveis aos consumidores em hipóteses de

cancelamento de voo. Os principais Tribunais de Justiça do país têm reconhecido a

existência de danos morais em situações em que o passageiro sofreu prejuízos

significativos em razão do cancelamento não justificado, conforme a seguir:

 

EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO. TRANSPORTE AÉREO.

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PROVIMENTO. I. Caso em Exame

Autores adquiriram passagens aéreas de Natal a Belo Horizonte, com voo

cancelado após três horas de espera no aeroporto, resultando em atraso de 15

horas na chegada ao destino e perda de um dia de trabalho. Questão em

Discussão A questão em discussão consiste em analisar (i) a pretensão de

majoração da indenização por dano moral fixada em favor de parte dos

autores; e (ii) o cabimento de indenização por dano moral e sua quantificação

em relação a autor cujo pedido de indenização foi julgado improcedente.III.

Razões de Decidir. O Superior Tribunal de Justiça estabelece que o dano moral em transporte aéreo não é presumido, exigindo prova da lesão

extrapatrimonial. Comprovação de atraso significativo e perda de dia de

trabalho justificam a indenização. Dispositivo em Tese. Recurso provido para

fixar indenização de R$ 5.000,00para cada autor. Tese de julgamento: 1. Dano

moral não é presumido em transporte aéreo, exigindo prova. 2. Indenização

fixada em R$ 5.000,00 por autor é compatível com precedentes.

Jurisprudência Citada:STJ, REsp 1796716/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi,

3a Turma, j. 27.08.2019.TJSP, Ap. 1056882-22.2024.8.26.0002, Rel. Des.

Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca, 13ª Câmara de Direito Privado,

j. em 24/02/2025 TJSP, Ap. 1136366-83.2024.8.26.0100, Rel. Des. Márcio

Teixeira Laranjo, 13ª Câmara de Direito Privado, j. em:21/02/2025.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SENTENÇA DE

PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE REQUERENTE. DANO MORAL

E DANO MATERIAL. ALTERAÇÃO DE HORÁRIO DE VOO. ATRASO

DE 9 (NOVE HORAS) PARA CHEGAR AO DESTINO. INDENIZAÇÃO

POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DEVIDA. FIXAÇÃO DO

QUANTUM INDENIZATÓRIO EM R$ 7.000,00 (SETE MIL REAIS)

PARA CADA APELANTE. PARÂMETROS DESTA CÂMARA CÍVEL E

DESTE TRIBUNAL. APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE

PROVIDA. (TJ-PR 0004902-21.2023.8.16.0017 Maringá, Relatora.:

Desembargadora Ana Cláudia Finger, 8ª Câmara Cível, Data de Publicação:

03/09/2024)

APELAÇÃO CÍVEL. Ação de Indenização por Danos Morais. Transporte

aéreo internacional de passageiros. Sentença de Procedência. Inconformismo

da Ré. Atraso e remanejamento de voo, com perda de conexão. Alegação de

manutenção programada. Hipótese de fortuito interno, inerente à atividade

econômica da Empresa Ré. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

Responsabilidade objetiva da transportadora (Artigos 734 e 737 do Código

Civil). Falha na prestação de serviço configurada (Artigo 14 do Código de

Defesa do Consumidor). Danos morais in re ipsa. Autores que precisaram se

deslocar para outro Aeroporto, sem assistência material, tratando-se de

menores impúberes. Indenização que vai fixada em R$ 6.000,00 (seis mil

reais) para cada um. Quantia que se mostra razoável e proporcional a reprimir

o ato, sem aviltar ou implicar em enriquecimento a quem recebe. Sentença

m a n t i d a . R E C U R S O D E S P R O V I D O . ( T J S P , A p .

1142987-67.2022.8.26.0100, Rel. Penna Machado, 14ª Câmara de Direito

Privado, j. em: 24/04/2023.

 

5. Conclusão.

Diante do exposto, é evidente que o cancelamento de voo representa não

apenas um contratempo logístico, mas também uma potencial violação dos direitos do

consumidor. A legislação brasileira, por meio do Código de Defesa do Consumidor e da

Resolução nº 400/2016 da ANAC, oferece um arcabouço sólido de proteção ao

passageiro, assegurando-lhe direitos como informação adequada, reembolso,

reacomodação, assistência material e, em casos de prejuízo comprovado, indenização

por danos morais e materiais.

Portanto, é essencial que o passageiro conheça seus direitos e esteja

preparado para reivindicá-los sempre que necessário. Ao mesmo tempo, cabe às companhias aéreas adotar medidas de prevenção e agir com transparência e diligência

em situações adversas, garantindo o respeito ao consumidor e a boa-fé nas relações

contratuais. A consolidação desses direitos por meio da jurisprudência reforça a

importância do equilíbrio nas relações de consumo e a responsabilidade objetiva do

fornecedor frente aos riscos inerentes à atividade de transporte aéreo.

REFERÊNCIAS:

ROCHA, Renata. Cancelamento de voo: motivos, direitos e o que fazer. Disponível em:

https://www.copastur.com.br/blog/cancelamento-de-voo/. Acesso em: 27 abr. 2025.

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